Advento: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós”(João 1, 14)
A Igreja já caminha para a segunda metade deste tempo litúrgico, aparentemente curto. Porém um tempo rico em significados e simbolismos. O advento, período de preparação para o Natal do Senhor tem muito a ensinar…
Na contramão da sociedade hodierna, onde a volúpia das informações e a ansiedade pelos acontecimentos assolam desde os mais pequeninos até os mais vividos; onde o tempo é sempre curto e as preocupações sempre nos acorrem céleres ao pensamento: é o fechamento do ano, confraternizações, despedidas, novos planos, metas a serem cumpridas, programações de ceia de natal e reveillon. Estas e muitas outras atividades fazem parte da vida dos cristãos; assim como o Advento também o faz.
A Igreja – Mãe e Mestra – nos apresenta esse tempo de preparação, dividido ao longo de quatro semanas de reflexão e aproximação ao Menino das palhas, na gruta de Belém. Diante de uma sociedade que se inebria ao estardalhaço de sons, luzes e cores; os cristãos são convidados a se enriquecerem do eloqüente silêncio que brota da contemplação do presépio e da escuta atenta à Palavra de Deus.
É mister saber que o termo “advento” vem do latim “advir, adventus” e significa chegada, vinda. Desde as obras dos primeiros tempos da Igreja que “adventus” é um termo utilizado para designar a vinda de Cristo à terra, ou seja, sua Encarnação, inaugurando a era messiânica, bem como, sua vinda gloriosa no fim dos tempos.
Foi nos idos de 590, com São Gregório Magno, Papa, que se redigiu o primeiro ofício para este tempo litúrgico. Depois, no século V, quando o Bispo de Tours, São Perpétuo, estabeleceu um jejum de três dias antes do nascimento do Senhor. Passados vários séculos, já no século IX, é que a duração do Advento fora reduzida a quatro semanas, como se pode ler numa carta do Papa São Nicolau I (858-867) aos búlgaros.
É do nosso conhecimento, então, que o advento é um período de quatro semanas no qual a Igreja se rejubila com a primeira vinda de Cristo, lá em Belém, numa simples gruta, bem como, antecipa com esperança a segunda vinda do Messias. Adentrar a este tempo é deixar-se inflamar por um desejo de ir ao encontro do Senhor, assim como fizeram os pastores e os reis do Oriente.
A espera inebriante é esse tempo que verifica a nossa fé na travessia do deserto de nossa existência até chegarmos à terra prometida, junto de Deus. O Senhor, de fato, vem! Esta é a fé da Igreja! E por isso juntamente com seus filhos ela aclama: “Vem, Senhor Jesus”, para que o Reino de Deus se instaure em nosso meio e se nos manifeste a sua graça.
Uma pergunta surge quando se percebe a dicotomia entre o que é o Natal do Senhor e a simples idéia de mais um Natal. Como nós cristãos enfrentaremos o consumismo e as futilidades que querem tomar conta de tudo? Como enfrentar a fantasia criada pela torpe ganância que nos faz esquecer o principal?
Por isso é deveras importante observar-se o calendário litúrgico. Ele nos alerta para não nos esquecermos da simplicidade que envolveu o nascimento e a vida de Jesus e a nos prepararmos para recebê-lo em nossas vidas, em nossas casas.
Além disso, é fundamental perceber tudo o que acontece nas celebrações, seus ritos e momentos fortes. Nossa igreja está diferente: há uma coroa de velas, paulatinamente acesas semana após semana. Há a cena do nascimento de Jesus, o presépio, onde todas as figuras caminham para a manjedoura. São estes sinais que nos ajudam a contemplar o grande mistério da nossa fé.
Se os reis do Oriente não estivessem atentos a estrela, certamente não encontrariam a Família de Nazaré. Ao mirar no espaço uma estrela brilhante, idéias nos acorrem ao pensamento. Os poetas, também, em todos os tempos, nela se têm inspirado. Já o parnasiano Olavo Bilac ouvia as estrelas e aconselhava:
“Amai para entende-las
pois só quem ama pode ter ouvido
capaz de ouvir e entender estrelas”
No modernismo, a sensível Cecília Meireles diz:
“Não quero ouvir mais cantar
quero silêncio de estrelas
voz sem promessas do mar”
E o inigualável Manuel Bandeira, no seu simbolismo sutil, procura a estrela da manhã:
“Procurem por toda parte
pura ou degradada até a última baixeza
eu quero a estrela da manhã”
Solitária no centro do presépio a estrela permanecia à vista dos reis do Oriente e indicava que naquele lugar nascia, com grande responsabilidade, o Rei dos reis e Senhor dos senhores, Jesus. Que a estrela de Belém também possa nos encaminhar ao mesmo destino, alegre e feliz, de todos aqueles que buscaram e encontraram com o Deus-menino em suas vidas.
E que essas duas últimas semanas do Advento nos sejam proveitosas!
Fr. Felipe F. Borges
Oração diante do presépio
Menino das palhas, Menino Jesus,
Menino de Maria, aqui estou diante de ti.
Tu vieste de mansinho, na calada da noite,
no silêncio das coisas que não fazem ruído.
Tu é o Menino amável e santíssimo,
deitado nas palhas porque não havia lugar
para ti nas casas dos homens
tão ocupados e tão cheios de si.
Dá a meus lábios a doçura do mel
e à minha voz o brilho do cantar da cotovia,
para dizer que vieste encher de sentido
os dias de minha vida.
Não estou mais só: tu és o nosso companheiro
de minha vida. Tu choras as minhas lágrimas
e tu te alegras com minhas alegrias
porque tu és meu irmão.
Tu vieste te instalar feito um posseiro
dentro de mim e não quero que teu lugar
seja ocupado pelo egoísmo que me mata
e me aniquila, pelo orgulho que sobe à cabeça,
pelo desespero.
Sei, Menino de Maria, que a partir de agora,
não há mais razão para desesperar
porque Deus grande, belo,
Deus magnífico e altíssimo
se tornou meu irmão.
Santa Maria, Mãe do Senhor e Palácio de Deus,
tu estás perto do Menino que envolves
em paninhos quentes.
José, bom José, carpiteiro de mãos duras,
e guarda de meu Menino das Palhas,
protege esse Deus que se tornou
mendigo de nosso amor.
Menino Jesus,
Hoje é festa de claridade e dia de luz.
Tu nasceste para os homens na terra de Belém.